A Sorte do Desnorte da Morte sem Consorte




(Sorte)


Quando Van Gogh, na sua infinita bondade e saudade de um passado que nunca foi verdadeiramente vivido, quis unir a sua torrencial demência criativa a outro génio de igual estirpe - Gauguin, algo de terrível aconteceu.

De génios e de loucos todos temos um pouco..

Van Gogh e Gauguin tinham muito, e não pouco, quer de génio, quer de algo que se confunde através dos tempos com a loucura mas que se torna, com o desvanecer da névoa da mortalidade e sobretudo da eterna inveja tão tipicamente humana, em autêntica mestria psicológica.



(Desnorte)


Muitos, hoje em dia – aqueles que estão sempre ausentes das reais razões que movem os artistas - trataram logo de culpar Gauguin pelo suicídio e extrema debilidade psicológica a que Van Gogh chegou.

Será isto factual ?

Será isto a verdade do que se passou?

Na hoje mítica e ridiculamente endeusada casa amarela, um ser com uma alma do tamanho do mundo mudou a história da pintura, entrou pelo Impressionismo adentro e transformou-o em Expressionismo, arrastando consigo um turbilhão de emoções descontínuas e de intensidade que qualquer humano desconhecia e desconhece, até hoje, seja esse humano o Zé da esquina ou o maior dos doutorados em História da Arte da nossa praça.



(Morte)


Cada génio tem o seu próprio Tempo de sentir, de existir, de sofrer, amar e morrer.

Gauguin tinha o seu, e não deixou nunca que Van Gogh pudesse intervir nessa área.

Será correcto, justo, criticar, atacar Gauguin, agora?

Cada um tem o seu Tempo.

E será a Natureza, e as suas forças abstractas - e não Deus, como muitos afirmam, a decidir o que foi justo, nesta vida que se esvai como areia por entre os dedos de uma estátua de sal, ao redor de um destino qualquer.



(sem Consorte)


A Arte, essa, nunca morre. Mesmo que nunca tenha existido, mesmo que apenas assista ao que ainda não é nascido.

Amo Van Gogh porque ele amou a natureza e me transmitiu esse amor.
E respeito Gauguin, pois ele amou as trevas e as forças obscuras, de que o mundo é feito.

É desta matéria de que são feitos os sonhos do mundo.

Desistiram bem cedo da burguesia das emoções.

Deram o seu futuro às crianças do futuro e seus corações.

Deixaram os seus amores bem fundo, trazidos em desespero no passado do mundo.

Seja feita (alguma) justiça através destas poucas palavras a dois monstros sagrados da pintura, da arte, da vida e da morte.


Tenho dito.


Comentários

Mensagens populares